31.5.10

Segunda,Versão

Com o passar dos anos, haverá uma ninhada inteira de meninos misturados e nascidos aqui. Os meninos, chineses, pretos e brancos, serão todos desta urbe. Vão todos cantar hip-hop e grafitar as paredes. Precisamos unicamente parar, escutar e refazer a maneira dos nos ver.

28.5.10

Sexta,Capital

Hoje há montes de coisas a fazer, destacando-se o o filme de Guenny Pires. Mas também há cinema documental e ainda uma palestra que promete, a partir das 17h, nos Negócios Estrangeiros (não me recordo do título) que tem a ver com a Integração, Africana no caso. Esta semana decorria a Semana d'África e foi uma oportunidade para nos confrontarmos com a nossa ausência desse conceito, África.

Gostei imenso da ideia de que, talvez, em vez procurar uma entidade única que se chama África, devêssemos nos orientar para várias Áfricas. Se grupos de interesse começarem a se associar entre si, talvez comece a desenhar-se mais unidade neste nosso continente maltratado. Se homens de negócios de tal região se associarem, se um grupo de países tem uma associação, se grupos de artistas cooperam, se participamos nos eventos uns dos outros, ou seja, abrindo vários vectores de união, parece ser uma perspectiva bem mais realista que o um tal falado "Estados Unidos de África"; isso nunca existirá, porque este continente é enorme, fisicamente e culturalmente. União continua a ser a palavra; o caminho para lá chegar é que tem que ser repensado.

Ouvi dizer que o FESMAN (Festival Mundial de Artes Negras) que devia se realizar no ano passado em Senegal e foi cancelado, será realizada este ano. Como é que se submete a candidatura? Ou vão fazer a coisa estilo panelinha mais uma vez? Se os assuntos públicos em África fossem tratados de forma pública, já seria uma grande ajuda para a construção de países melhores.

Mas hoje há muito que fazer, aliás como tem havido nesta nossa capital e felizmente. Pena é que não haja registo, logo não haverá memória, não há debate e nem consequência. Pelo menos, a quem se interesse, vamos aproveitando uma lições...de borla.

Bom FDS.

27.5.10

Quinta,Essência

In Expresso das Ilhas, pág 20 e 21, 26 de Maio de 2010

Seria bom que nos puséssemos a mexer, para entender, agir, exigir, ou fazer qualquer coisa para tirar esta história a limpo. Se o tal médico fez mesmo tais afirmações, convinha que esse aprendiz de Salazar desse boas explicações. Seria bom que as autoridades dos dois países, que ultimamente rasgam elogios de parte a parte, averiguassem esta situação. Vou estar impacientemente à espera...Até porque vem aí Cavaco e queremos todos sair bem na fotografia, não?!

25.5.10

Regozijo de notícia


PRÉ-LANÇAMENTO BUALA [em fase de teste]

Temos o prazer de convidar a visitar online o BUALA, novo portal de Cultura Africana Contemporânea: www.buala.org

A partir de hoje, e durante 30 dias, o portal funcionará em fase de teste para darmos a conhecer o projecto a um grupo de pessoas, instituições e empresas que julgamos poderem ter interesse em colaborar activamente nesta ideia. Estamos portanto permeáveis a sugestões, correcções e novas colaborações.

Com o apoio da Casa das Á fricas [Brasil] e Fundação Calouste Gulbenkian [Portugal], foi possível implementar o site que agora apresentamos. Aguardamos comentários,

Pela equipa BUALA,

Marta Lança,
.....................

BUALA é o primeiro portal multidisciplinar de reflexão, crítica e documentação das culturas africanas contemporâneas em língua portuguesa, com produção de textos e traduções em francês e inglês.
 BUALA significa casa, aldeia, a comunidade onde se dá o encontro. A geografia do projecto responde ao desenho da proveniência das contribuições, certamente mais nómada que estanque. A língua portuguesa, celebrada na diversidade de Portugal, Brasil e Áfricas, dialoga com o mundo. 
 BUALA pretende inscrever a complexidade do vasto campo cultural africano em acelerada mutação económica, política, social e cultural. Entendemos a cultura enquanto sistemas, comunidades, acontecimento, sensibilidades e fricções. Políticas e práticas culturais, e o que fica entre ambas. Problematizar questões ideológicas e históricas, entrelaçando tempos e legados. No fundo desejamos criar novos olhares, despretensiosos e descolonizados, a partir de vários pontos de enunciação da África contemporânea. 
 BUALA concentra e disponibiliza materiais, imagens, projectos, intenções, afectos e memórias. É uma plataforma construída para as pessoas. Uma rede de trabalho para profissionais da cultura e do pensamento: artistas, agentes culturais, investigadores, jornalistas, curiosos, viajantes e autores, todos se podem encontrar e habitar este BUALA.

Pai,Filho,Espírito

Nada como um jogo de futebol para libertar o que vai na alma dos homens. Depois do empate de Cabo Verde frente a Portugal, farto-me de divertir com as reacções de parte a parte. O jogo era amigável e Portugal deve ter esperado que, jogo amigável mais país de terceira categoria no futebol mundial, aquilo iria ser um passeio no relvado. O jogo era amigável, mas para Cabo Verde era uma das raras oportunidades para medir forças com um top 10 mundial. Portugal não gostou da seriedade (ou quase rudeza) como Cabo Verde encarou o jogo; Cabo Verde não está gostando de como Portugal tem atribuído toda a culpa na equipa e por nenhum momento lembrou-se de parabenizar a humilde equipa CV. Ainda Portugal vai acusar João de Deus de traidor, querem apostar?

...Enfim, digo-vos, homens, tomem juízo!

24.5.10

Blogjoint:Desemprego

O projecto Blogjoint regressa. Os jointers não quiseram desistir tão rápido e, sinceramente, encheu-me de alegria saber que a geração desanimada vai dando lugar a uma geração batalhadora.

O tema desta semana é o Desemprego. Bem, isso pode ser visto de diversas maneiras, essencialmente técnicas, com grandes teorias económicas que o expliquem, mas também pode ser entendido de forma básica, diria até naive, como sendo...falta de trabalho, nada que fazer, braços cruzados.

É evidente que num Estado moderno, esperamos que seja o Estado a promover o emprego, tanto público como privado. "Esperamos" é a palavra chave. Muitas vezes o Desemprego (problema sério) parece-me tão somente como um sistema de esperas. Os agentes estão a espera de medidas de política, os cidadãos estão à espera de serem chamados a trabalhar, o próprio Governo está a espera que a conjuntura melhore ou que os investimentos se façam, e por aí adiante. Isso já se torna um cliché, mas repetimo-lo: e o empreendedorismo? Qual é o significado desta palavra? Não quererá dizer unicamente "despertar nos cidadãos o sentido que devem criar o seu próprio emprego"? Mas que tipo de emprego? Que nível técnico? Que produtos e serviços?

O Desemprego, num país que precisa construir tanta coisa, é filosoficamente contraditório. Por mais que expliquem de forma científica, que existe assim e assado, parece-me sempre uma contradição, ainda por cima numa economia que cresce no nível forte, como fazem crer os números. Sou tentado a pensar que o nosso desemprego é mais uma faceta de desarticulação das políticas.

22.5.10

Sim Excia, mas...

(imagem a partir de foto de A Nação, de 20 a 26/05/2010)

Após ler a grande entrevista à Ministra do Ensino Superior, Ciência e Cultura (MESCC), fiquei com um misto de alegria e tristeza. Quanto ao Ensino Superior, tenho a certeza que ela vai fazer algo. Foi o grosso da entrevista, até porque é de casa e deve ter encontrado alguma coisa feita do Ministério da Educação, para além do conhecimento íntimo das problemáticas do sector. Fiquei alegre. Não tenho assim tanto entusiasmo quanto à Ciência, porque é algo que ninguém sabe por onde começar, nem a própria ministra, que quando perguntada sobre as prioridades de investigação, respondeu com um vaguíssimo “temos o mar”…

Agora, para a minha continuada frustração, o que não vai mesmo sair da cepa torta é a Cultura. Fiquei triste. Decididamente, este é um sector que precisa de um departamento próprio. Precisa de definições de base, do programa do Governo, após estudos especializados, de se definir o que é afinal a acção do Governo no sector da Cultura. É investigação? É promoção? É conservação? É financiamento? A Ministra não tem ainda nenhuma política definida para a Cultura. É que nenhuma dessas áreas funciona, nem percebi que vão funcionar a breve trecho. Investigação, tem sentido que passe para a Ciência, para as universidades, por isso toca a acabar com o Instituto de Investigação (e Património) Cultural. Digam-me, em 10 anos o que é de investigação saída desse instituto? Promoção também não faz sentido ao nível do Governo (explico mais adiante). Conservação sim, ninguém mais o poderia fazer, embora ao nível do Estado as coisas estejam mal! Vão lá ver o Palácio da Cultura e os seus instrumentos. Vejam o Plateau e o centro do Mindelo e os abates do Património. Vão ver a Cidade Velha, as monstruosidades que se faz em pleno sítio arqueológico. Como é que se chama aquele museu com os espólios da arqueologia marítima? Viram o que fizeram com o pequeno cais que fica na rotunda que dá para o Plateau, via Gamboa? O Património é uma área que precisa intervenção forte, com leis, com fiscalização, com pesadas reprimendas, com educação e com economia, é claro. Património morto também não serve. Financiamento da Cultura, por outro lado, é das áreas governativas que faz confusão; quem disse que o Governo deve financiar a Cultura? Nunca! O papel do Governo deve ser de articular as políticas (começou a explicação sobre a Promoção) para o ensino (História e Cultura), para a formação (formação artística já!) e principalmente para as condições para o exercício das actividades culturais: direitos aduaneiros, lei do mecenato, isenções fiscais, concursos (transparentes), enquadramento dos profissionais na previdência social e na carreira, protecção autoral (efectiva) e demais garantes, para quem escolha como modo de vida, trabalhar em áreas da Arte e da Cultura.

Gosto da energia que sai dos seus olhos Ministra, mas infelizmente isso só não conta. Tem de estar preparada para dar respostas mais concretas ou então assumir que em área x e y, o campo é desértico. Fiquei tristinho com o facto de a Arte não constar das suas preocupações. Quanto a pergunta sobre as suas preferências artísticas, foi uma armadilha. Enquanto dirigente política, ou deve ter uma leitura mais expandida da realidade (estar atenta aos movimentos contemporâneos, ver para a produção das várias áreas, ter nomes para além dos óbvios, ver as tendências e linguagens actuais, os paradigmas novos) ou então dar aquelas respostas típicas, politicamente correctas, do género “sou eclética, gosto de tudo um pouco, gosto dos consagrados, mas também gosto das tendências actuais, penso que são positivas e precisamos dar mais visibilidade a certos movimentos”. Estou a puxar a brasa para as minhas cavalinhas? Claro! Sabe Ministra, enquanto artista visual, você representa-me politicamente. Cada palavra sua tem peso e medida para mim.

21.5.10

Sexta,Capital

Há bem pouco tempo (anos) as autoridades sanitárias lutavam contra as doenças infecto-contagiosas, que eram as que mais matavam. Esse tipo de doenças estão directamente ligadas à falta de higiene. Hoje as autoridades vão ter que lidar com as doenças cardio-vasculares, as que mais matam agora. Essas também estão directamente ligadas à falta de higiene. Só que o tipo de higiene é diferente.

A vida urbana mata. Nem é a violência ou os surtos infecciosos que mais matam. É o nosso próprio estilo de vida. Passamos a maior parte do tempo sentados; andamos de transportes; fazemos pouco exercício físico, mas o que mais mata é o que comemos e bebemos. Somos um país hipertenso e isso deve em grande parte ao sal e à gordura. Quando acharem que estão a usar pouco sal e pouca gordura, ainda é demasiado. Se antes o trabalho físico (profissão, andar a pé, passeios, ir à praia...) precisava dessa energia e sais minerais, hoje, com a mudança radical de estilo de vida, o sal e a gordura devem baixar radicalmente no nosso paladar. Primeiro vão achar a comida insossa e "seca", mas depois habitua-se. Outra coisa que nos mata é o açúcar. Temos muitos diabéticos, que desenvolvem uma série de outras complicações. Sinto muito caros amigos, é cultural, mas os doces caseiros deviam ser seriamente postos em causa. E a carne? Sabem de onde raio vem a carne que consomem? Sabem em média quantos dias passa um frango no gelo antes de virar churrasco? Conhecem as condições de abate dos animais? Se tem coisa que me assusta na nossa alimentação é o uso da carne; é como comer bombas todos os dias.

Façam exercício pessoal. Pais, metam os filhos na ginástica desde pequenos. Acabem com a televisão. Vão andar. Mas principalmente mudam de hábitos alimentares. Experimentem ser mais vegetarianos e, garanto-vos, há de tudo: em vez da carne, comam feijões todos os dias; em vez do açúcar, experimentem o mel de abelha ou de cana, ou experimentem nem o usar; comam legumes; a banana é um óptimo fruto; bebem água, água, água; bebam chás; experimentem condimentos naturais, como as ervas; ganhem o hábito da sopa; não comam demasiado à noite.

Álcool é o outro capítulo que é igualmente maléfico. Somo um país de alcoólatras. Nós próprios, da simples parodinha, estamos em perigo eminente. Eu adoro o vinho e a cerveja, mas encher a cara só pode ser admitido em ocasiões muito especiais. Se acontecer muitas vezes (vários FDS), tenham cuidado malta.

Com isso bom FDS, com a cervijinha de praxe...moderadamente ;)

17.5.10

Segunda,Versão

A Electra já mandou providenciar os famosos contentores-geradores, que para mim significam o reconhecimento da incompetência dessa empresa em cumprir com a sua missão e um temeroso sinal que os cortes de energia vão começar a ser mais frequentes, mais longos, mais irritantes. Esses contentores, apesar de serem "reforços" de produção, significam logo que vai haver problemas. É como se o Min.Saúde começasse já a distribuir remédios contra a Dengue, sabendo que não vai poder evitá-la. A comparação é terrível? Ah pois! Também é terrível esta situação da Electra. Quanto custarão em aluguer esses contentores? Quanto custarão esses "suplementos" energéticos em termos de consumo de carburante? Quanto nos está a custar a manutenção desta continuada incompetência?

A Electra é capaz de nos levantar os cabelos de pura raiva. Quem não perde a cabeça, estando em frente ao computador, naquele momento, absorto nos seus pensamentos e a tentar traduzi-los em trabalho, quando, PUF! Mais um corte de energia. Mais longas horas de espera. Mais longas horas de irritação.

E o povo quer é festejar o Benfica!! Como diz um ditado local, ou adaptamo-nos ou morremos. Adapto-me. Escrevo sobre isso para me aliviar.

14.5.10

"Joguei dez contos no lixo. E eu joguei 30 contos no lixo"

Essa era uma publicidade na rádio de um negócio em S.Vicente. Está ou não está provado que S.Vicente é um Brasilin? A gentxi devi falá o qui quizer, né? Num joga fora nada, cara!

13.5.10

Somos violados prolongadamente, sem dor. Quando abrimos os olhos, as terras já não são nossas e as praias já só tem pedras. Dos mares vão desaparecer as tartarugas. Quando abrimos os olhos já haviam prédios vedados. As pessoas vão fingir felicidade em piscinas privadas, os vizinhos vão se ver nos interfones. Somos governados. A verdade hoje é relativa e os fins justificam os meios. A porrada, o roubo, os desvios e tudo o que pareça inadequado de momento, no fim será justificado.

Buscas policiais aos gabinetes e denúncias em jornais são só tentativas tardias de espernear. Somos atados e silenciados por mãos próprias, ou provavelmente aterrorizados por súbita liberdade. Por lei actos consentidos não se constituem abuso. É por vontade própria, ou embriagados em alucinantes expectativas? Não, é por amor mesmo, vendo caras e não corações.

12.5.10

A crise grega explicada aqui (blog do Emílio). Qualquer semelhança com a nossa realidade é mera coincidência.

Eu,Tu,Eles

Há momentos como esses. O exótico Bar Holanda e a exuberante Laginha. Nascia o dia. Partilhávamos histórias. Trocamos abraços e mimos. Irmanamos.

A todos as pessoas que me fazem sentir bem no Mindelo. A todas as pessoas de bem.

11.5.10

Espanta-me a minha ilha S.Vicente, de cada vez que aí vou, como se não me cansasse de espantar. Nunca vi fenómeno como os festejos da vitória do Benfica em S.Vicente. Aquilo não existiu. Um cineasta andava a fazer um filme e a cidade toda do Mindelo era o set, e o povo todo do Mindelo eram actores. Três camiões auto-tanques faziam chuva artificial. A coisa evolui de gritaria histérica, para batucada de carnaval, para tambores de S.Jon, para capoeira, à tantas entrou na festa carros com música electrónica amplificada, houve fogo de artifício, umas meninas aproveitaram as roupas molhadas e a bebida que ia circulando em garrafas de todo o género, para rebolar as bundas mal vestidas, e os rapazes se juntaram também. A coisa ficou assim por horas, começando em canções e gritos de guerra de futebol, para batucada e simplesmente uma paródia generalizada. Nunca vi aqui tanta gente vestida da mesma cor. Nunca vi tão rápida mobilização, nem mesmo para casos de calamidade. Nunca vi um povo que torce tanto por um outro. Isto devia dar material para muita dissertação, mas creio que ainda é cedo. Que é sui generis, lá isso é.

10.5.10

Rumos

Aos amigos Rui e Irina. Esteve tudo perfeito no vosso casamento. Desejo que

Norte

Estou aqui no meio de uma coisa chamada “Ponte D’Água” (que o pessoal da Praia chama, divertidamente, Ponta D´Água), no Mindelo, que me parece resumir muito bem o meu Mindelo. Que me desculpem os detractores mas é lindo. É no mínimo de bom gosto arquitectónico, algo extremamente raro neste país. É uma espécie de pontão em cima do mar, com piscina e esplanada; um restaurante lindo com mini esplanada; um belo bar; cabeleireiros, boutique e, o que gostei menos, escritórios. Mas, o que nisto resume bem o meu Mindelo é a capacidade desta cidade ter coisas lindas, alinhadas com o cosmopolitismo genético das gentes daqui, para depois se enquadrarem numa ilha economicamente e socialmente deprimida. Já não consigo ouvir qualquer explicação lógica para a estagnação desta ilha cheia de tesouros. O discurso da vitimização em relação à Praia já não tem sal, de igual modo é o discurso da crise mundial. Eu simplesmente não consigo perceber (porque não percebo mesmo disto) como é que estando tão perto de gerar valor, não se gera; que clique é que falta. Leio um cronista português, a propósito da crise despoletada pela Grécia, que está a contagiar, ou pelo menos está a focalizar a atenção em, Portugal. O cronista fala da endémica falta de confiança do português (para além de todas as outras coisas, como a baixa produtividade, etc.) como um catalisador da crise, ou seja uma causa de inércia. Faltará à cidade do Mindelo, ou seja, às suas “forças vivas”, a confiança de que podem, e devem, traçar um caminho distinto da Praia? Manias de responsabilizar o Governo! Da parte pública, Mindelo tem um aeroporto internacional, tem um porto ainda melhor que o da Praia, tem as melhores infra-estruturas básicas de saneamento, electricidade, água e esgoto; tem uma cidade de melhor qualidade urbanística e até tem um parque industrial prontinho à espera de indústrias. Não faltará aqui um arregaçar de mangas dos privados locais?

Norte-Sul

Vem dois ou três aviões carregados de turistas da Praia para o Mindelo, porque coincidiram eventos que nos fez vir aqui. No Mindelo já não sou um simples filho da terra; sou também turista. Gosto de vir ao Mindelo desfrutar da sua ausência de rebuliço, a boa disposição das pessoas, a qualidade urbanística da cidade e a qualidade dos seus espaços, infelizmente vazios de clientes, mas bonitos. A minha mais recente paixão, Zero Point Gallery, galeria d’arte e bar, de Xand, amigo de infância e um dos mais brilhantes artistas plásticos cabo-verdianos da actualidade. Enquanto se espera o famigerado investimento externo, que nunca mais chega, não podíamos falar de turismo interno? As passagens não podiam ser ainda mais barateadas? As agências não deviam estar a fazer pacotes incentivando os nacionais a se deslocarem dentro da sua própria terra? E todos os serviços locais não deviam estar à espera e prepararem-se, que vem aí dois ou três aviões da Praia, normalmente com gente disposta a gastar. Se, como reclamam a todo o tempo os mindelenses, temos mais dinheiro, que nos façam vir aqui mais vezes (para além do apelo familiar) distribuir esse dinheirinho.

6.5.10

Quinta,Essência

O sul está na ordem do dia. O sul do norte desta vez. Portugueses e espanhóis não querem ser comparados com os gregos. A Grécia tida com o berço da civilização ocidental, hoje é símbolo de falhanço de Estado. Gastaram mais que deviam, são indisciplinados nas contas, fazem arruaças, até já causaram mortes de inocentes, assustando os investidores e parceiros políticos. Ainda a Espanha consegue escapar-se da comparação, porque lá tem os seus atributos, mas Portugal não vai se safar de adjectivos que se reservam a países do sul, como se houvesse um determinismo entre a latitude geográfica e a capacidade dos países.

É claro que essa adjectivação "sul", que encapsula uma data de outras coisas, é grosseira e ofensiva. Mas, nós africanos, sul-americanos, sul-asiáticos, que somos sul a tempo inteiro, já nem nos importamos com isso. Apanhamos tanto que não causa mais dor. Ouvimos tanto que não choca mais. Mas hoje, quando vejo a onda quase que a querer prever a incapacidade de Portugal de se justificar por si próprio, fico a saber que a palavra "sul" não é uma referência geográfica; é uma dessas palavras condensadoras de vários preconceitos, como é a palavra "negro".

Agora já sabem irmãos do norte a sul, o que sentimos quando nos chamam pelo nome genérico de sul. Não que não sabiam, mas estavam esquecidos de como é.

Frases Piri-Piri

"O racismo não é um todo, mas o elemento mais visível, mais quotidiano, para dizermos tudo, em certos momentos, mais grosseiro de uma estrutura dada."
Franz Fanon

5.5.10

Quarta,Parede

Eram meninos, não inimigos. Meninos nunca são inimigos. Na parte de manhã andavam na mesma escola. À tarde, depois dos trabalhos de casa, brincavam na mesma rua, tranquila nesse tempo. Francisca era assim, uma planta frágil que se tinha de regar, endireitar e tirar as folhas secas a toda a hora. Corriam livres, faziam jogos, inventavam. Era Nuka quem sempre vencia, decidia e batia em Francisca por qualquer motivo, porque ela caia, errava no jogo, dizia uma parvoíce, porque apetecia-lhe, por tudo. A pequena Francisca chorava. Mas tinha Kiko que lhe amparava nos grandes braços e peito. Kiko investiu-se da missão de estar ao seu lado a vida toda, até hoje, casados. Na rua afastava as pessoas, distraídas ou malvadas, que vinham embater-se nela, na escola defendeu-lhe o melhor que soube, de Nuka e de todos.

Cresceram assim, na rua do restaurante de Dona Anastácia, mãe da Francisca, onde também trabalhavam a mãe da Nuka e o pai do Kiko, ela empregada de mesa, ele guarda e faz-tudo. Dona Anastácia, a patroa, era uma personalidade imponente e generosa, apesar da enfraquecida filha. Ajudou os meninos como se tratassem os três de seus próprios filhos, mas tinha especial admiração por Nuka, pela firmeza do seu corpo de menina criança, pela sua pele cor de café, até perecia que herdara a firmeza dos seus olhos e não os da mãe. Mas um dia, Nuka, por alguma razão, tinha sovado severamente a sua Francisca. Acabou a bondade. Dona Anastácia parou tudo à sua volta, cuspia fogo, quase arrancava as orelhas à pequena Nuka, brigou por mais de vinte minutos, Nuka foi se esconder atrás da saia da mãe, muda e impotente. A patroa que tinha fingido por muito tempo não reparar no abuso permanente à sua pequena, não teve outro remédio senão correr com elas dali para nunca mais.

Francisca passou a gerir o negócio depois da doença da mãe, doença de arrependimento. Francisca revelou dotes de empresária após o curso. Fez crescer o restaurante, hoje lindo e reputado. Emagreceu toda. Dizia-se que era a roupa que estava de pé. Os olhos afundaram-se em olheiras escuras. Foram vários anos, muito mudou, e um dia Nuka entrou no restaurante de mala na mão. Estavam no expediente, Francisca a distribuir as ordens e Kiko, sempre ao lado, como que em eventualidade dela cair. Kiko foi apanhado de surpresa pela repentina aparição de Nuka, não se conteve de contentamento e foi recebê-la num asfixiante abraço. Francisca um passo atrás, indecisa, sorriu de esgar. Nuka vinha à procura de emprego. Francisca sorrindo mais um pouco, não disse palavra, aguardou que ela implorasse finalmente, Por favor Francisca, preciso.

4.5.10

Pai,Filho,Espírito

"Morte de guineense à pedrada provoca tumulto (A Semana). Nova Constituição da República de Cabo Verde em vigor desde segunda-feira (Inforpress). Cabo Verde é quarto país africano com mais liberdade de imprensa (A Semana). "

Isto aqui parece um rally. Arranca, pára, acelera, trava, curva, lomba, salta, espatifa, recupera, continua...Tem de continuar, ora com dor, ora contente.

3.5.10

substâncias cibernéticas tóxicas

Depois dos 3 últimos comentários a este blog, cheirando a tripa podre, fico a pensar para quê ter isto aberto aos comentários. É que há indivíduos, como acontece com alguns bêbados e drogados

2.5.10

Segunda,Versão

Quando um grupo de homens discute em tom firme, podem apostar tudo, falam de futebol. Pode ser de política, mas nesse campo sai ofensas pessoais, sai revelações perturbadoras, cedo ou tarde acaba mal…não, não era política. Perdi a linha do raciocínio que tinha estado por mais de duas horas a urdir em frente ao computador. Um grupo de homens discutia num tom que me levou a perceber que talvez estivesse para acontecer um evento importante, ou já tinha acontecido. Tentei me manter ocupado com o que me mantinha ocupado, mas a discussão tinha uma textura diferente das outras tantas, só não sabia ao certo do que se tratava, e lá fiz daquelas perguntas que podem levar uma pessoa à morte, De que falam? Tive a certeza que, se algum dos homens estivesse armado, estaria agora com uma bala cravada na testa. Por sorte não tem balas nos olhos. O quê?! Existe algum ser vivo masculino sob a face da terra que não saiba que amanhã é o jogo do século? O mundo ia parar e eu não sabia. O mundo estaria prestes a ter uma transformação grave e eu não sabia. Como me passou? É caso de se pensar em psiquiatria, quando uma pessoa está num estado de absorção tal, que se aliena do facto simples, e no entanto de particular importância para a humanidade, vai ter jogo. Não sabia, não vi, não berrei, não sai pulando pelas ruas, não estou triste, nem contente, só me sentindo um ET. Não vi o jogo do século.